Agência FAPESP - O terceiro Prêmio Nobel de 2006 foi para outro norte-americano. Depois de John Mather e George Smoot (Física) e de Craig Mello e Andrew Fire (Medicina), a Academia Real de Ciências da Suécia anunciou nesta quarta-feira (4/10) o ganhador do Nobel de Química: Roger D. Kornberg, 59 anos, professor da Escola de Medicina da Universidade Stanford.
O anúncio ocorre 47 anos depois de Kornberg ter acompanhado o pai, Arthur, a Estocolmo, para receber o Nobel de Medicina de 1959 por estudos genéticos, mesma linha de trabalho seguida pelo filho. Arthur, que dividiu o prêmio com o espanhol Severo Ochoa, tem 88 anos e outro filho pesquisando na mesma área: Thomas Bill Kornberg, 58 anos, que descobriu o DNA polimerase II e o DNA polimerase III, em 1970, e é atualmente professor da Universidade da Califórnia em San Francisco.
A escolha do Nobel de Química de 2006 distingue os trabalhos de Kornberg com a síntese protéica a partir da transcrição genética, processo essencial à vida. O norte-americano descreveu como a informação genética é copiada do DNA para o RNA mensageiro que, por sua vez, carrega a informação para fora do núcleo da célula de modo que possa ser usada na construção das proteínas essenciais às células e ao organismo. O processo é catalisado pela enzima RNA polimerase.
“Roger foi premiado pelos seus estudos sobre as bases moleculares da transcrição em eucariotos, organismos cujas células contêm um núcleo no qual o DNA é armazenado, como o homem. A transcrição é o processo pelo qual cópias de RNA são sintetizadas a partir do DNA, uma etapa essencial da atividade gênica”, disse Claudio Joazeiro, professor do Instituto de Pesquisa Scripps e do Instituto de Genômica da Novartis, nos Estados Unidos. O pesquisador brasileiro colaborou com Kornberg em artigo recente.
Para que o corpo humano faça uso da informação armazenada nos genes, é preciso que uma cópia seja feita e, depois, transferida para as partes exteriores das células. Ali, ela é usada como uma instrução para a produção de proteínas. Esse processo é a transcrição.
Kornberg foi o primeiro cientista a montar um modelo de como funciona a transcrição no nível molecular de um grupo importante de organismos, os eucariontes (ou eucariotos), cujas células têm um núcleo bem definido – animais, por exemplo, fazem parte desse grupo.
“Particularmente impressionante foi o fato de ele ter sido o primeiro a gerar uma ‘imagem’ desse processo em nível molecular, com a determinação recente da estrutura da RNA polimerase, a enzima responsável, ou seja, em ação. Esse feito envolveu uma tour de force extraordinária e quase três décadas de trabalho, por se tratar de uma enzima enorme, composta de várias subunidades. Como resultado, agora entendemos como a transcrição ocorre no nível atômico e temos a descrição de como as suas etapas iniciais são controladas”, disse Joazeiro à Agência FAPESP.
Mecanismo da vida
“A partir de uma perspectiva menos reducionista, as descobertas de Kornberg, em geral, contribuem com peças fundamentais para a compreensão de, por exemplo, como os genes são regulados de forma a gerar os diferentes tipos de células do organismo a partir de uma única célula-ovo”, explica Joazeiro.
Sem a transcrição, a informação genética não é mais transferida para diferentes partes do organismo. Com o fim da renovação celular, o organismo morre em poucos dias. É o que ocorre em alguns casos de envenenamento, em que as toxinas interrompem o processo de transcrição genética. Distúrbios no processo estão envolvidos em doenças como câncer, diversos tipos de inflamação e problemas cardíacos.
“A transcrição é necessária para todo tipo de vida e a descrição detalhada desse mecanismo, feita por Roger Kornberg, se constitui exatamente na categoria de ‘mais importante descoberta química’ a que Alfred Nobel se referiu em seu testamento”, disse o comunicado da academia sueca. O mais importante prêmio científico foi atribuído pela primeira vez em 1901, a partir do desejo de Nobel, que morreu cinco anos antes, de que sua fortuna fosse distribuída dessa forma.
Ao lado de Joazeiro, Claudio Masuda, professor da Universidade Federal do Rio de Janeiro, colaborou com Kornberg no artigo Ubiquitin ligase activity of TFIIH and the transcriptional response to DNA damage, publicado na revista Molecular Cell.
Os Kornbergs são a sexta dupla de pai e filho a ganhar o Nobel. A família Curie tem três prêmios: Física (Pierre), Marie (Química e Física) e Irene Joliot-Curie (a filha do casal de cientistas franceses, que ganhou em Química, como a mãe).
Este foi o primeiro ano desde 1983 em que apenas norte-americanos ganharam os prêmios de Física, Química e Medicina. O Nobel de Economia será anunciado no dia 9 e o de Paz no dia 13. A data de divulgação do Nobel de Literatura ainda não foi definida. Os prêmios – cheques, medalhas de ouro e diplomas – serão entregues em 10 de dezembro, aniversário da morte de Alfred Bernhard Nobel (1833-1896), o inventor da dinamite.
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http://nobelprize.org
Por Heitor Shimizu